Geopolítica em Tempo de Paz e Guerra

Geopolítica em Tempo de Paz e Guerra reflecte a complexidade, as zonas cinzentas e as contradições do mundo actual. Mas o título sugere de imediato uma interrogação: vivemos em paz, vivemos em guerra, ou, paradoxalmente, numa zona híbrida?

Olhar para o mundo exterior e tentar compreendê-lo é uma necessidade numa era de globalização. Num passado não muito distante, o local ou o nacional eram quase tudo o que interessava à grande maioria dos cidadãos. Conhecer o que se passava no mundo era fundamentalmente uma opção, a qual se mostrava até bastante difícil de concretizar. Na maioria dos casos, resultava de necessidades empresariais-comerciais, ou migratórias, ligadas à procura de melhores condições de vida e de ganhos de bem-estar. Em casos muito específicos, por outro tipo de razões profissionais, esse interesse estava também presente nos que prosseguiam actividades ligadas à diplomacia e à política externa do Estado. Apenas em circunstâncias excepcionais — tipicamente grandes guerras ou outros acontecimentos de grande impacto — o mundo exterior levava a um interesse generalizado da população, obrigando a segui-lo e a tentar compreender o que aí se passava.

Geopolítica em Tempo de Paz e Guerra— o título ressoa deliberadamente a Raymond Aron em “Paz e Guerra entre as Nações” — reflecte a complexidade, as zonas cinzentas e as contradições do mundo actual. Mas o título sugere de imediato uma interrogação: vivemos em paz, vivemos em guerra, ou, paradoxalmente, numa zona híbrida? A resposta depende, desde logo, da parte do mundo em que vivemos. As percepções certamente são diferentes para os que vivem dentro da zona de “paz perpétua” da União Europeia, ou fora dela, por exemplo na Ucrânia, na Síria ou na Coreia Ao mesmo tempo, de uma forma menos óbvia, a resposta depende, também, da maneira como definimos paz e guerra. Não é uma mera questão semântica, nem se trata um jogo de palavras literário. No passado, a guerra era precedida de uma declaração de guerra e terminava com um armistício, ou a rendição (in)condicional de um dos beligerantes. Hoje temos inúmeros conflitos multifacetados, difusos e disputados por vezes na sombra, os quais escapam a uma simples categorização binária. Não há armistício, nem rendição, para guerras que não foram declaradas.

Neste século XXI vivemos um “admirável mundo novo”. Não é exactamente como foi imaginado por Aldous Huxley na distopia escrita nos anos 1930, embora existam traços que o fazem lembrar. Assistimos a uma perigosa luta pelo poder mundial, marcada pela rivalidade sino-americana. A uma extraordinária transformação da geopolítica da energia, onde a América do Norte readquiriu centralidade e o Médio Oriente e a Venezuela perderam influência relativa. E a uma União Europeia que continua com a sua debilidade crónica político-militar, algo que se tornou mais crítico com o Brexite Donald Trump nos EUA. É um mundo globalizado simultaneamente moderno, pré-moderno e pós-moderno. Nele, as fronteiras entre a paz e a guerra, mas também entre a verdade e a mentira diluíram-se assustadoramente. Para a análise destas múltiplas e importantes temáticas que marcam o mundo contemporâneo, o livro foi estruturado em cinco partes autónomas, mas também estreitamente (inter)relacionadas entre si: o “admirável mundo novo” do século XXI; a União Europeia entre a integração e a fragmentação; a “América primeiro” e a globalização descartada; a emergência da China como potência global hegemónica. E a nova geopolítica do petróleo e o colapso da Venezuela  […].

© José Pedro Teixeira Fernandes,  excerto da Nota introdutória ao Livro  “Geopolítica em Tempo de Paz e Guerra” (Almedina, 2019)

©  Imagem: capa do Livro de José Pedro Teixeira Fernandes, “Geopolítica em Tempo de Paz e Guerra” (Almedina, 2019)